quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Duas orações

Duas orações.




Na minha vida por duas vezes me ajoelhei e fiz duas orações,uma pedindo que meu pai morresse e outra para que meu pai vivesse,foram me negado os dois pedidos,então Deus e eu fizemos um acordo tácito,não peço nada e ele não me exige nada.

Hoje ja posso escrever sobre o que aconteceu,as feridas fecharam mas a cicatriz ficou,cicatriz feia,nunca desaparecerá.

Eramos oito filhos,oito crianças tipo escadinha,papai trabalhava em Pantano Grande,era ferreiro,quando chegava quase na hora de vir do serviço íamos espera-lo,então pegamos sua sacola azul marinho ,o beijávamos e vínhamos felizes como só as crianças sabem se-lo.Dentro da sacola tinha sua marmita e dentro dela sempre havia um restinho do almoço que deixava para nós.Não passávamos fome nem nada mas o gosto daquela comida era especial.

De noite quando estávamos deitados ele nos cobria,um beijo com gosto de Kolinos,da cama pedíamos:

-A bênção pai,a bênção mãe!

_Deus te abençoe,era a resposta.

Uma vez por mês vinha a capelinha da santinha,uma casinha de madeira com a imagem de nossa senhora do rosário,acendíamos um velinha,ajeitávamos flores e de joelhos era puxada uma reza com fé.tudo era tão simples,tão pobre e somente hoje percebo que éramos milionários.

Na hora das refeições todos na mesa,mesa cheia de alegria,de risada,,hoje nem mesa tem mais,todos cresceram,foram embora,só fiquei eu com os fantasmas que me perseguem,fantasmas de um tempo que passou,morreu e não volta mais.

_Alemão vem comer,Rosaria não vira nada na mesa tu é muito estabanada,Ruti deixa de ser molóide!!!!!!!!!!

Tudo ia tão bem até que meu pai adoeceu,anjina,pressão,teve que se encostar como dizíamos,ficar recebendo auxilio doença do INPS,oito bocas com um salário de merda,papai se sentia culpado,hoje eu sei ,mas naquele tempo não,começou a beber e quando bebia não era mais o meu pai,era ruim,xingava ,brigava,quebrava a louça,não dormíamos,então pedi a Deus que matasse meu pai.

Não fui atendido,claro,passara-se os anos,e meu pai se queixava de dor no estomago,até que foi diagnosticado câncer,no dia que soubemos fazia um sol lindo,entrei com ele no consultório,Dr Luiz Henrique olhou os exames e pude captar um sombra em seu rosto,ou foi a pausa procurando palavras,mas soubemos que era câncer sem ter dito nada,quando saímos na rua em frente a rodoviária meu pai estava calado,as pessoas passavam,a rua estava cheia,então ouvi um soluço,meu paizinho tinha parado na calçada e não percebi,voltei e  pus minhas mãos nos ombros dele e perguntei:

_O Sr que viver ou morrer?Juro que respeitaria a descisão dele.

_Quero viver!

_Então vamos lutar!

O abracei bem apertado e numa rua ensolarada atapetada de gente ele chorou,eu não podia chorar tinha um batalha pra enfrentar.

Foi operado,arrancaram setenta por cento do estomago,eu fiquei no corredor frio e branco de madrugada,esperando noticias dele,ate que a enfermeira com pena de mim,mandou entrar e vê-lo.

Foi um sucesso,mas íamos fazer quimio e radio terapia,depois de cinco anos deram como curado,que alegria!!!!!

No sexto ano o câncer voltou com toda força e tomou conta do corpo de paizinho,seu Osmarzinho.

_Plac,plac,plac,plac!

Era o único som que se ouvia no corredor do hospital,minha mente não queria estar ali,não queria ver,não queria acreditar,meu pai estava agonizando.Parei no umbral da porta,e ele estava olhando para o teto o rosto magrinho,de fraudas,soro nas veias,a cor escura,como se uma sombra pairasse sobre ,engoli o choro ,sentei ao seu lado apertei a mãozinha magrinha:

_Seu Osmarzinho!

_Hã?

_Tu sabe que eu te amo?

_Tambem te amo!

Nunca tinha dito ao meu pai que o amava,e o perdendo, a verdade me veio como um raio fulminante,eu o amava muito.

E pela segunda vez fiz uma oração,pedi a Deus que deixasse meu pai viver,pedi,implorei,implorei tanto.

Meu pai morreu,a família se reuniu novamente,meus irmãos,todos chorando a morte do nosso pai,o homem grandão de barba preta,que passava a mão no cavanhaque,que ria pra dentro.

Agora eu podia chorar mas estava sem força nem pra chorar,só um vazio sem tamanho tomava conta de mim,fiquei eu na casa azul com meus fantasmas.

_Alemão quer melancia?

_Ruti cuidado com o braço quebrado!

_Rosária toma conta da Rose!...........................

FIM

Pai afasta de mim este cálice,mas seja feita a tua e não a minha vontade!