domingo, 20 de fevereiro de 2011

O preço de tirar a máscara






O preço de tirar a máscara.


Ele tinha uma vida um pouco acima dos demais da vila,empregado público era até mesmo invejado,casa bonita,mulher,um casal de filhos,tudo normal dentro dos parâmetros da normalidade que a sociedade exige,era um exemplo de homem de bem.

Com o tempo sendo tão estimado,tão bom cidadão,correto e reto,se candidatou a vereador e ganhou,daí sim passou mais ainda a ser paparicado,pessoas faziam questão de estarem ao seu lado,um exemplo!

Ele era mais um garoto da vila,mais um filho pobre duma vila pobre que gera filhos como peças de fábrica,se bem que sua beleza chamava atenção,era tudo que tinha, a beleza, parece que deus num gesto de piedade deu-lhe isto como consolo,já que não deu mais nada.

Se encontraram,como era inevitável,e foi paixão instantânea,algo ali aconteceu de muito forte,se amaram e com o tempo foram cada vez mais vistos juntos,as pessoas começaram a conjecturar,a desconfiar,mas nada de concreto.E eles sempre juntos,até que a coisa tava demais e foi dado o flagrante,foram pegos se beijando.Se separou,deixou a casa para a mulher e filhos e passou a morar na garagem de sua própria casa,depois nem isso,teve que ir para um barraco junto com seu amor,os filhos já grandes não queriam nem ouvirem seu nome,mas aceitavam a pensão,e tudo que tinha.

Os amigos sentiam vergonha de estarem ao seu lado, o mandato terminou e perdeu o cargo,estava pagando caro demais pelo seu amor,mas pagava e pagaria sempre,apesar de tudo era feliz,fez uma casa num balneário pequeno e ali morava com o menino,feliz como nunca foi,sempre viveu um personagem que queriam que fosse,agora era ele,sem mascaras,sem se esconder,era bom ser verdadeiro,caminhava leve,contente.

Naquele dia choveu,a enchente tava grande,eles estavam em sua casinha,quando o garoto pegou um fio para ligar o radio de pés na água,o fio estava desencapado,foi só um soco,não gritou,só contraiu o corpo e caiu morto.Fulminado.

Com o corpo do garoto em seu colo sem pressa de procurar ajuda ele olhava a chuva caindo,com sua mão acariciava seu cabelo e lembrava de como gostava de ver o vento balançar este mesmo cabelo agora sem vida ,passou a mão no rosto frio,no nariz que gostava de puxar irritando seu dono,não chorou,não tinha força,sabia que tinha morrido também,ficou imaginando quanto tempo teria que suportar,beijou a testa de seu amor e saiu na chuva ,não sentia o vento nem a água,não sentia nada.

O garoto foi enterrado,nada mais tinha importância,sempre com a cabeça baixa era visto pelas ruas,isolado como um cachorro sarnento,ninguém o cumprimentava,era feio,um fiapo de gente.Um mendigo.Menos que animal,era puto e ser puto não tinha perdão,os pais preferiam terem um filho ladrão que puto.

Passaram os dias,os meses,um ano,cada vez mais magro,macilento,agora tropegava ao caminhar,falava sozinho,ria como se tivesse alguém ao seu lado,até que um dia parou de ser visto,ninguém ligou,ninguém se importou,ninguém procurou,ninguém perguntou.

O vereador que caminhava de camisa social era convidado para festas de batizado,casamentos,jogos onde era goleiro,todos queriam ser vistos ao seu lado.Morreu só numa cama suja no mesmo lugar onde seu amor tinha morrido,foi encontrado morto sem nem ter alguém para lhe dar um copo d´ agua,morreu só.

Enterrado as pressas e esquecido mais depressa ainda.

Descanse em paz.

Edson Novais
Rio pardo,20 de fevereiro de 2011