quinta-feira, 28 de abril de 2011

Por Favor ,Senhor,Faz Voltar O Tempo

Por Favor ,Senhor, Faz Voltar O Tempo
"a casa estava escura no frio ,o vento forte, a chuva desabou, voce não vem, eu aqui estou a rezar na escuridão e só"



Tudo branco, o chão, as paredes,os uniformes,menos minha alma que em desespero se agarrava a um fio de esperança tal qual um naufrago se abraça a uma pedaço de tábua para não morrer,eu me segurava neste fiapo de esperança pra não enlouquecer.Precisava manter a todo custo minha lucidez.
Olhava o fim do corredor onde ela estava sendo socorrida, nada, o suor brotava de meu rosto apesar da noite fria, as pessoas passavam por mim mas eu não as via,somente o corredor longo e branco,eu aguardava.Por fim uma silhueta ao longe,mas próxima,mais,mais,ouço ,agora, os passos nas lajotas ,passos brancos,lajotas brancas.Minhas mãos se crispam , aguardo ansioso uma boa noticia,ela escapou desta,reagiu,voltou!Sorrio, tinha plena certeza que as palavras seriam boas, tudo voltaria a ser como sempre foi.
_Ela morreu, sinto muito.

Acordei cedo, bem mais cedo que todos, fui ao fogão,a chama azulada esquentando água e leite,eu ria sozinho, seria uma surpresa e tanto,passei o café,o aroma impregnando a cozinha de madeira,cortei pão,pus margarina primor de tablete,coloquei tudo numa bandeja de plástico,e segui atravessando o pátio,a minha esquerda a bergamoteira, a direita o galinheiro,um pé de fumo brabo para pneumonia,um girasol para enfeite,goiabeira, cheguei na casinha de madeira caiada de branco,coloquei a mão por dentro da porta e achei a tranca,abri,entrei na cozinha de chão batido,o fogão de lenha,a mesa de madeira,a bacia de lavar o rosto, segui adiante pé ante pé,no quarto a cama com o bidê ao lado, o guarda roupa com um faqueiro em cima, dentro dele os tesouros de meu avozinho,o cabelo enorme repousava no travesseiro,minha avó dormia,do outro lado meu avô,cheguei bem pertinho de seu rosto e sussurrei:
_Vózinha, vózinha!
Abriu os olhos lentamente, quando me focou sorriu:
_Tição, é tu?
Levantei a bandeja, revelando a surpresa:
-Adorado!Coisa linda da vó!

Fui pegar água,meu avô se recostou na cama, sorriam felizes e eu mais ainda.
Sempre digo que toda casa tem seu esteio e da nossa era minha avó Elvira, tinha uma energia que contagiava a todos, dançáva-mos conforme sua musica e a amávamos como loucos, baixinha,sempre com um lenço na cabeça,brincos de argola,pulseiras de prata,varias, cobrindo seus pulsos magros,os olhos pequenos,opacos, cheios de sabedoria de quem entende a natureza humana e seus meandros.
Pois naquela manhã me convidou pra ir ate um bairro próximo, eu não desconfiei de nada, não disse o que ia fazer, mas por estes dias havia um zunzunzun que o rosto de Jesus tinha aparecido numa árvore,todos queriam ir ver o milagre,ela quieta.Quando passava-mos em frente a casa do milagre, enveredou portão adentro,em redor do tronco tinha um barbante e pregado muito dinheiro,de certo a pessoas tentavam comprar uma boa impressão com JC,ela imediatamente esbravejou contra a dona da casa,chamando quem estava la de ignorantes,uma força emanava dela como se a raiva a agigantasse,fomos embora,no futuro eu deveria prestar mais atenção pra não cair de novo,se tivesse me contado, nunca que eu iria.
Outra coisa que a tirava do sério era o ciúme que nutria pelo avô, seu grande amor, vivia cuidando, com olhos de águia, pra que ninguém o roubasse dela.Benzedeira,parteira,cartomante,conselheira,sua casa vivia em movimento o dia inteiro,a pessoas vinham,traziam os filhos,saiam felizes.
_Vó,tem gente!
_Traz um copo de água e uns raminhos!
O doente se sentava com a mãos nos joelhos, ela molhava os ramos e começava a reza em cochichos, usando palavras mágicas que só ela sabia,mas funcionava.As vezes conforme a gravidade eram usados tições de brasa pegos com uma tesoura,nunca entendi como não caía.
No final do dia ela se sentava em frente da casa, a sombra de uma enorme arvore de guabiju nos protegia do sol, tinha um degrau de cimento,ali ela colocava sua cadeira,e esperava ,daqui a minutos, como se tudo fosse combinado ,começa a chegar sua família.Tio Argeu com sua enorme barriga,mamãe,tia Dêla,Nadir, e começam os causos,o chimarrão corria,a chaleira recendia a chá de cidreira.Todos felizes,creio que a felicidade era por estarmos perto dela.
Na cozinha a panela fervia e refervia com costela de porco,quando estava quase se desmanchando era acrescentado arroz,Deus meu aquilo era delicioso!
Não podíamos de jeito nenhum cruzarmos os braços na porta,não prestava,sexta feira santa,ela caia em depressão e eu caia junto porque o ano todo nunca a via triste e chegava neste dia chorava,porque nosso senhor estava sendo crucificado, sentia como se estivesse acontecendo naquele momento,muito triste.
Nos contava sempre de quando trabalhava na barca,esta época a marcou muito,porque sempre repetia ,fazíamos de conta que ainda não sabíamos e ouvíamos sempre como se fosse a primeira vez.
Os anos passavam , esta felicidade inocente,na minha cabeça duraria pra sempre,foi então que meu avô teve câncer e após uma longa fase ruim morreu,nunca vi tanta dor num ser humano como vi em vovó,ela murchou,a vitalidade sumiu,não benzeu mais ,a cuidamos como se fosse um cristal que um vento mais forte quebraria,tudo pra que ela ficasse conosco,mas não queria,queria partir e partiu dali a quatro meses.
Era aniversario de um amigo, Gonho,preparamos um jantar surpresa,vó Elvira iria,milagrosamente concordou,ficou se arrumando, dali a minutos alguém viria busca-la.
Estava na sala quando alguém chegou avisando que a vó tava caída no chão,corri,corri ,peguei aquele corpo frágil,leve como a pluma que usava pra colocar talco no pescoço ,no carro com ela no colo ,eu cochichava,pedia ,implorava,as lagrimas correndo pelo rosto_
-Não morra vó,não morra vó,por favor,por favor,não morra!
Tudo branco, o chão,as paredes,os uniformes,menos minha alma que em desespero se agarrava a um fio de esperança tal qual um naufrago se abraça a uma pedaço de tábua para não morrer,eu me segurava neste fiapo de esperança pra não enlouquecer.Precisava manter a todo custo minha lucidez.
Olhava o fim do corredor onde ela estava sendo socorrida, nada, o suor brotava de meu rosto apesar da noite fria,as pessoas passavam por mim mas eu não as via,somente o corredor longo e branco,eu aguardava.Por fim uma silhueta ao longe,mais próxima,mais próxima,mais,ouço ,agora, os passos nas lajotas ,passos brancos,lajotas brancas.Minhas mãos se crispam , aguardo ansioso uma boa noticia,ela escapou desta,reagiu,voltou!Sorrio, tinha plena certeza que as palavras seriam boas, tudo voltaria a ser como sempre foi.
_Ela morreu, sinto muito.
Não esbocei um movimento, nada,não chorei,nada,apenas um nada invadia minha alma,neste momento eu sabia que tudo tinha se acabado,nada seria como antes.
A casa foi desmanchada, as arvores arrancadas,a cerca de arame com um gramadinho na frente foi substituido por grades, as pessoas sumiram,as crianças cresceram,mamãe foi embora,não sobrou nada sobre nada.
Nada.
As vezes, quando estou triste e principalmente na sexta feira santa , com fé e esperança rezo:


_POR FAVOR SENHOR ,FAZ VOLTAR O TEMPO,POR FAVOR, POR FAVOR,POR FAVOR, por favor, por...

Edson Novais,Rio Pardo

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