quinta-feira, 16 de junho de 2011

A Mão Que Balança O Berço

A Mão que Balança o Berço



Click.
O som discreto foi retumbante no silêncio pesado.
As algemas apertaram seus pulsos,a multidão assistia quieta sem entender direito o que estava acontecendo.
Antes de entrar na viatura olhou para trás ,fixou a imagem de sua casa na mente,finalmente teria paz!
Finalmente.
No barranco em frente de sua casa ela observa o asfalto,os carros passam velozmente, a vida também.
Como as coisas chegaram neste ponto não podia atinar,seu barraco miserável,seus filhos andando pelados junto com porcos e galinhas,já se acostumara com o mau cheiro,não sentia vontade de mudar,não tinha perspectiva de um futuro melhor,um filho de cada pai,feitos os filhos,os maridos sumiam do mapa,como se já tivessem feito sua obrigação,nenhum carinho,nenhum abraço.
Sentada na cadeira de madeira com o sol batendo na cabeça ,ela pensa em como arrumar comida prá hoje,no pátio uma trempe com uma panela vazia esperava,os meninos também.
Miserável,esta palavra definia sua vida,a casa de madeira na beira dum barranco,numa vila de invasão,a cama no chão,o colchão de trapos onde dividia espaço com cães e com filhos,um guarda roupa desbeiçado achado no lixo ,jogado pelos donos do asfalto.
Gordinha ,baixinha,já cinquentona,o cabelo curto,o vestido de um tecido pobre,os dentes da frente faltando,talvez por isso não sorrisse.
Uma mão venda seus olhos,ela sorri,sabe quem é,mas finge não saber:
_Quem é?
_Adivinha!
Diz vários nomes,e erra sempre,até que pega a menina no colo e enche de cócegas,o único afeto em vários anos,talvez sua filha fosse a única neste mundo que sentisse algo por ela e não entendia o porque deste amor,mas Aline a amava .
Dormiam abraçadas dividindo a dor de viver,a menina sem saber que existia uma outra vida,onde podia brincar com bonecas,estudar,tomar banho de chuveiro,comer doces,roupas decentes,TV...
O tempo passava vagarosamente como se fizesse de propósito,quando é ruim devagar, quando é bom ,rápido.
Uma batida na porta,abriu a tranca e o que viu suspendeu sua respiração,ele era alto,forte,moreno,isso na sua visão,porque não era tão alto,era gordo,mulato,com uma garrafa na mão ,mostrava sinais de estar bêbado,a menina atrás dela observa o homem conversando com sua mãe,o riso,suas antenas detectam o perigo,a atenção não era mais dela mas direcionada ao estranho que entra no barraco ,se senta .
Na madrugada procura o braço de sua querida e não encontra,chora com medo.
Os dias passam num novo balanço ,a mulher esta feliz,canta,ri,apaixonada,a vida é bonita,tudo vai melhorar.Seu namorado passa a freqüentar cada vez mais o casebre,Aline cada vez que o vê foge para longe,ele por sua vez a detesta e começa o duelo,o novo casal bebe até cair,a menina despeja sua raiva,brigam.
Um dia ele se cansa e vai embora, vai procurá-lo e recebe o ultimato:
_Ou ela ,ou eu!Se livra da menina que eu volto.
Volta pra casa,como se livrar?
Volta a ficar parada em sua cadeira,pensativa,longe,o pensamento absorto,tentando achar um meio,a garota brinca na imundície ,não se aproxima,sente que não deve.
A noite cai,se abraçam novamente pra dormirem,a guria feliz,tudo voltara a ser como antes,um sorriso,o sono.
A mãezinha abre os olhos,confere que a filha dorme,pega o travesseiro,aproxima do rosto,tapa e joga o peso em cima,a menina se debate,faz força,ela pressiona mais,mais,,até que o corpinho se afrouxa e fica inerte,acende o fósforo ,encosta no pavio da vela,ilumina o rostinho ,esta roxo,a língua de fora,coloca o ouvido no coraçãozinho,nada,esta morta.
Pega o corpo põe no guarda-roupa,esconde com cobertas e dorme.
No outro dia La pelas dez da manhã a vizinhança ouve os gritos de desespero:
_Roubaram minha filha!Acudam!Socorro!
Todos correm ,ao saberem da tragédia chamam a policia,tinham roubado Aline,Aline sumiu.
Um mutirão foi formado, procuravam a menina,a mulher chorava desconsolada,ninguém achou nenhuma pista,a radio local fazia chamadas pedindo informações.
Quando anoiteceu foram pras suas casas, observa que não tinha mais ninguém, pega o corpo magrinho,já enrijecido,embrulha num trapo , direciona-se até um campo e joga sua filha dentro dum poço abandonado.Fecha bem e volta pra cama.
Ele não apareceu,talvez no outro dia.
_Mãe,eu to com frio!
Senta-se . O suor escorrendo,o coração aos pulos,foi um pesadelo.
O sol esta a pino as buscas reiniciam,o namorado não aparece,nem hoje nem nunca mais.
A semana passou e cada vez mais ela ouvia a voz da garota pedindo ajuda:
_Mãe,to com frio!
Não suportava mais,não dormia,não comia,estava enlouquecendo,na madrugada ia até o poço ,conferia se estava bem fechado e voltava,até que uma ligação alertou a policia do que ela estava fazendo.
Click.
O som discreto foi retumbante no silêncio pesado.
As algemas apertaram seus pulsos,a multidão assistia quieta sem entender direito o que estava acontecendo.
Antes de entrar na viatura olhou para trás ,fixou a imagem de sua casa na mente,finalmente teria paz!
Finalmente.
A sirene machucava seus tímpanos, a viatura corria pelo asfalto agora ela não observava mais , estava nele.
Os bombeiros retiram o corpo já em deterioração, foi enterrado num caixãozinho doado pela prefeitura, no chão, flores de plástico,uma cruz de lata.
A cidade se indignou,nunca se dignou a visitar o barraco,nem dar uma boneca de plástico vagabundo,um chinelo com enfeite vindo da china,mas ficou horrorizada ,com pena da menina,as pessoas são boas.
A mãezinha foi pra cadeia,jamais voltou,morreu na cela.
A felicidade não era algo que fosse concedido a sua pessoa.
Antes de morrer ouviu a voz de Aline:
_Mãe,tô com frio!
_Espera filhinha,já vou,meu amor,meu único amor!



Edson Novais,Rio Pardo,Rs

3 comentários:

  1. Nossa! espero que essa história não seja verídica.
    Sou mãe de 2 filhos e estou gravida de novo. Não concigo imaginar uma mãe fazendo uma barbaridade dessa. doeu dentro de mim.

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  2. Nossa! espero que essa história não seja verídica.
    Sou mãe de 2 filhos e estou gravida de novo. Não concigo imaginar uma mãe fazendo uma barbaridade dessa. doeu dentro de mim.

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  3. Nossa! espero que essa história não seja verídica.
    Sou mãe de 2 filhos e estou gravida de novo. Não concigo imaginar uma mãe fazendo uma barbaridade dessa. doeu dentro de mim.

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Obrigado pelo seu comentario,é muito importante para mim,me faz crescer,grande abraço.