terça-feira, 6 de setembro de 2011

Brincando Nos Campos Do Senhor

Brincando nos Campos do Senhor



_Alô,mano?
Ele sentiu um arrepio cobrir sua pele ,já sabia o que sua irmã falaria ,mesmo assim um fiapo de esperança se agarrava a ele,como cráca se agarra ao casco do navio.Em pensamento ele pedia;por favor não seja,por favor não seja!
_Mamãe morreu!

Devagarzinho foi largando o telefone,até ouvir distraído o clic,sabia que uma parte de sua vida acabava neste momento,tudo em sua vida foi prematuro,perder a infância,perder o pai,agora perder a mãe.
Arrastando os pés,caminhar normalmente era pesado demais ,foi ate a mesa ,que ainda continha os pratos postos,puxou a cadeira ,encostou a cabeça na mesa e chorou.











Um pingo de suor desceu pelo seu rosto indo parar na terra preta, na tarde quente de verão,ele capinava ao lado do pai,um homem sem muitas palavras,se bem que não precisavam porque seus olhos diziam tudo,os olhos falavam de amor,de trabalho,de luta,mas seria bom que a boca fizesse um pouco a sua parte,as vezes é preciso dizer que se ama!

O menino tem as perninhas fininhas,a pele clarinha,nariz enorme meio torto,era o ultimo filho,o rapa do tacho!Talvez por ser o mais novo também era o mais agarrado com o velho,vários irmãos,ajudava na horta que seu pai fez para aumentar o orçamento,enquanto escorava o cabo da enxada, feita pelo pai a sua medida,no queixo, olha os colegas de escola brincando com seu arco e roda, pelo arremedo de pórtico da entrada do frigorifico,se distrai, mas logo volta a cavoucar a terra,sabe que dali a pouco começa a segunda parte de sua tarefa diária,as vendas.
São dez horas da manhã pega seu balaio de vime engancha no braço ossudo, o velho enche com as mais vistosas verduras e o menino magrinho e pálido sai pelas casas a vender a mercadoria,no bolso um caderninho amarfanhado para anotar os bons fregueses, pros maus só a vista!

Na volta cansado,suado,a irmã o arruma pra escola,banho,uniforme e colégio!
Assim segue sua rotina,assim segue sua infância,muito trabalho,não sabe o que é brincar despreocupado pelas ruas com a molecada,acostumado com a lida ,seu mundo é o pátio da casa com os pais e irmãos.
Um dia chega cansado da escola ,larga o saquinho de açúcar união com os cadernos de folhas escuras na mesa,tira sua conga,estranha o silêncio da casa de madeira,parece que a casa trancou a respiração pra não fazer barulho,seu pai esta doente,seus irmãos quietos,a mana com expressão grave,vai até o quarto do pai e vê seu herói deitado dormindo,ele não era de estar deitado a toa,sente medo,não sabe bem do que ,mas intui,algo estava prestes a mudar sua estrutura.

O pai morreu!!!!!
Foi o grito que ouviu,desespero,lagrimas,choro,não podia acreditar,arregalou os olhos e sentou num canto pra não atrapalhar os adultos,ali deixou a lagrimas caírem,perdeu seu amigo.
Silêncio.
O silêncio doía mais que tudo,ia pra horta mas a quietude o perseguia,cadê seu companheiro?

Vê a enxada escorada na casa esperando seu dono,o chapéu,o radio,as lembranças,a dor,lágrimas escorrem,queria seu paizinho de volta!


O tempo passou,sua mãe casou novamente,o menino já é rapazinho,seus irmãos dispersaram,ele foi trabalhar no frigorifico,as mãos calejaram com a faca desossando,mas sentia que era pouco ,saía com amigos,ia dançar nos finais de semana no estúdio dez,não falou nada pra seu amigo mas estava de olho em sua irmã.

As luzes piscavam nos seus olhos ,vermelhas,azuis,amarelas,compassadas ao som de Cindy Lauper, Girls Just Wanna Have Fun,com uma garrafa de cerveja ,ela dançava com seus tênis bamba,sua calça apertada,jaqueta azul,olhou pra porta ,ela estava entrando ,seu sorriso faiscando,fixou o olhar nela,a musica ,como se fosse combinado, trocou pra Purple Rain de Prince,foi atravessando o salão encorajado pela bebida ,a tirou pra dançar,ela encostou o rosto em seu ombro e deixaram a musica embalar ,sem pensar em nada,só no calor dos dois,no restinho da canção ele a apertou mais um pouquinho convidando sutilmente pra próxima que viria,Bonnie

Tailor cantou e parece que deu sorte pro rapaz,se beijaram e nunca mais se largaram.
_Estou grávida!
A abraçou apertado prometendo que tudo daria certo,não deixou que ela percebesse que estava apavorado,com medo,tinha dezesseis anos,e seria pai,sorriu,a informação começou a cair em sua cabeça,já tinha começado a amar a criança,sempre trabalhou,teria que se esforçar mais mas faria o que preciso fosse,se juntaram,foram morar com a sua mãe num quarto nos fundos,mas ele planejava bem mais pra sua criança,queria dar tudo que nunca tivera!

Ta na hora!!!!!
As pernas finas tremeram,procurou o hospital não tinha anestesista,arrumou uma condução e a levou pra Santa Cruz,sem um real no bolso,só a coragem,lá ela ganhou uma menina,linda perfeita,sentado num corredor branco,sozinho ele chorou,encostou as mãos no rosto magro ,as lágrimas deslizaram,choro de felicidade,sua filhinha,sua!
Ela não iria trabalhar na horta,iria ter bonecas,amigas,infância!
Tinha que voltar pra sua cidade e dar a notícia pros familiares, mas não tinha dinheiro pra passagem.

Na mesma hora o farmacêutico olhava pra rua e pensava no sonho que tivera,uma pessoa apareceu enquanto dormia e lhe disse que alguém lhe pediria ajuda,que não se negasse,fazia parte da roda da vida.
Roda da vida.
O que significava?
Observou atentamente o rapaz magrinho entrando,se postou em sua frente:
_Minha mulher esta no hospital,ganhou minha filhinha e eu preciso de uma passagem pra ir pra casa!
Ele abriu a caixa registradora,contou o dinheiro e deu ,sem nenhuma palavra,não precisava entender.
A família estava feliz,a menina uma doçura,meiga,suave,com um rostinho angelical,mas o chefe de família não tava feliz com sua profissão,queria mais que o salário baixo da firma,então conversou com sua mulher e num ato de coragem foi pro estrangeiro onde morava sua irmã,lá foi frentista,longe da mulher,da filha,da mãe,sofreu um acidente e quase morreu,mas prosseguiu no seu propósito,por sua filha precisava crescer financeiramente,quando veio embora com o dinheiro que conseguiu comprou um terreno e ali fez sua casa,uma meia água,voltou ao seu antigo emprego e abriu um bar,com muita luta e sacrifício foi crescendo,ate se transformar num míni- mercado,precisava se dedicar em tempo integral ao mercado ,saiu do frigorifico.

O tempo foi passando,alegrias,tristezas,nada indicava naquele homem tanto trabalho porque sempre tinha um sorriso no rosto,um alegria de viver!




_Alô,mano?
Ele sentiu um arrepio cobrir sua pele ,já sabia o que sua irmã falaria ,mesmo assim um fiapo de esperança se agarrava a ele,como cráca se agarra ao casco do navio.Em pensamento ele pedia;por favor não seja,por favor não seja!

_Mamãe morreu!
Devagarzinho foi largando o telefone,até ouvir distraído o clic,sabia que uma parte de sua vida acabava neste momento,tudo em sua vida foi prematuro,perder a infância,perder o pai,agora perder a mãe.
Arrastando os pés,caminhar normalmente era pesado demais ,foi ate a mesa ,que ainda continha os pratos postos,puxou a cadeira ,encostou a cabeça na mesa e chorou.
Sua mãe morta,ao entrar no necrotério olhou pro caixão,as velas,a coroa de flores,a mãe!
Que dor!
Sua mãezinha,ele voltou a ser menino,queria sua mãe de volta!






Voltou a estudar se queria crescer precisava se equipar,trabalhava arduamente durante o dia e estudava a noite,o sono querendo vencer,cabeceava ,mas voltava a se concentrar,no outro dia era o mesmo,o mesmo sorriso.

Comprou um Fiat 147,seu orgulho,em sua visão era uma Ferrari,convidou a sogra pra primeira excursão,a um balneário a uns 10km,pra começar tava bom!
_Sogra este carro é bom,vou ate colocar numa poça e ele vai atravessar,aquaplanar!
Meteu a caixinha na poça e por ali mesmo o caco pifou e ficou!
Mas foi crescendo com tenacidade,teimosia,perseverância,comprou um palio,fiesta e decaiu novamente comprando um Tempra,todo bem!
Nasceu sua segunda filha,não pensou que poderia sentir novamente a mesma emoção,mas foi igual ao pegar aquela bonequinha branquinha no colo,e ouvir o choro sonoro nos ouvidos!
Não estava satisfeito ainda,vendeu tudo e foi embora pra outra cidade,recomeço!

Sem casa,sem amigos,praticamente sem nada,só com suas mãos,foi abrindo caminho,já formado em direito,trabalhou num shopping,e finalmente gerente de uma loja de brinquedos!
Sentado em sua poltrona com suas filhas ,sua neta,seus genros e sogrinha ao lado ele serve um chimarrão e finalmente se permite relaxar,nunca teve tempo pra parar,só trabalhar!
Não se arrepende de nada,é feliz,realizado.
Olhando pra árvore ao lado de sua casa persebe que o vento balança os galhos,é inverno,no lado de fora as pessoas passam encolhidas,conforme a direção do vento os passantes ouvem um naco de riso,olham pra casa e pensam:

Como não seriam felizes se tem tudo?

Edson Novais,rio Pardo,Rs


P.S:Meu amigo além de tenaz me fez ver que também é um sábio,assim que deu operou o nariz!As perninhas magrinhas não tem jeito!

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